O que diz a lei sobre os barulhos gerados pela igreja? Som alto durante o dia pode? E as vigílias na madrugada, pode som alto? Como a igreja se comporta diante deste fato? Vamos neste artigo dar uma olhada rápida nestes pontos.
Existe uma tal de “lei do silêncio”?
Existe um equívoco quanto ao assunto, não existe uma lei que cria uma mordaça e obrigue ao silêncio absoluto. O que temos são vários dispositivos na lei que priorizam o sossego e a saúde, e temos também algumas normas técnicas que orientam ou regulam o nível de ruído aceitável em determinados horários.
O que podemos entender por pertubação do sossego?
Para auxiliar neste entendimento, buscamos o trecho abaixo extraído do artigo “Pertubação do Sossego – Entenda a lei de contravenções penais” do site JusBrasil (recomendamos a leitura de todo o artigo).
Para caracterizar a contravenção penal de perturbação do sossego alheio (art. 42, LCP), é necessário que alguém perturbe o trabalho ou o sossego alheio a) com gritaria (berros, brados) ou algazarra (barulheira), b) exercendo profissão incômoda ou ruidosa em desacordo com as prescrições legais, c) abusando de instrumentos sonoros (equipamentos de som mecânico ou não) ou sinais acústicos, ou d) provocando ou não procurando impedir barulho produzido por animal que tem a guarda. A pena é de quinze dias a três meses de prisão simples ou multa. Sobre o assunto, eis o magistério de Silvio MACIEL:
A conduta é perturbar (incomodar, atrapalhar) o trabalho (qualquer atividade laboral) ou o sossego (repouso; descanso; tranquilidade; calma) alheios (de várias pessoas). Veja-se que a expressão “sossego” não está tutelando apenas o descanso ou repouso, mas também o direito à tranquilidade das pessoas. Ninguém é obrigado a suportar barulho excessivo e ininterrupto provocado por vizinhos, bares, lanchonetes, locais de culto apenas porque o som é provocado antes do horário de repouso. Em outras palavras, a contravenção pode ocorrer também durante o dia.
No artigo da OAB SP, publicam um artigo que complementa o entendimento:
De acordo com a LCP, a Lei de Contravenções Penais, no seu artigo 42, não se pode perturbar o trabalho ou o sossego alheio nas seguintes condições:
Com gritaria e algazarra;
Com o exercício de profissão incômoda ou ruidosa, em desacordo com as prescrições legais;
Com o abuso de instrumentos sonoros ou sinais acústicos;
Provocando ou não procurando impedir barulho produzido por animal de que tem a guarda.
A penalidade é de prisão de 15 dias a 3 meses ou multa, dependendo do caso. Portanto, não existe uma hora determinada para que qualquer pessoa utilize sons mais altos, que perturbem o sossego alheio, incomodando vizinhos.
Fonte: OAB SP – 2010 – Notícias – Perturbar o Sossego do Vizinho é Crime
Alguns municípios possuem leis que complementam a lei federal, regulamentando parâmetros adicionais, quem faz a fiscalização, punições, leis de zoneamento, entre outras questões. Estas leis municipais também devem ser observadas nesta questão.
Um ponto importante é a lei de zoneamento municipal, que estabelece que tipos de estabelecimentos podem se estabelecer em determinadas regiões, assim como em alguns casos como em São Paulo, que servem de apoio para a definição do nível permitido de ruído emitido pelos estabelecimentos, incluindo igrejas.
Durante o dia a Igreja pode fazer barulho normalmente?
Outro equívoco muito comum é achar que a perturbação do sossego tem um horário definido, e que somente após as 22 horas ou das 00h é que entre em vigor a “lei do silêncio”.
O que temos em algumas cidades que criam leis complementares ao tema é a regulação dos níveis de ruídos emitidos em determinados horários, determinando os níveis máximos permitidos por horário e/ou zona urbana. A ABNT fornece atualmente normas relacionadas ao conforto acústico, que servem de base para algumas destas leis municipais.
Ter parâmetros técnicos para emissão de ruídos se faz extremamente necessário, uma vez que questões como a percepção auditiva, cultural, ruídos no entorno, temperamento e condições do aparelho auditivo individual podem causar muitas variações. Podemos encontrar pessoas fisiologicamente semelhantes com percepções diferentes dos níveis de ruído. Uma pessoa que não gosta de crentes terá uma percepção de incomodo maior que uma pessoa indiferente.
A perturbação do sossego deve ser observada independente do horário, ou seja, durante o dia uma Igreja também pode ser autuada ou multada por excesso de ruídos, pios o direito ao sossego não tem horário estabelecido, é um direito vigente durante todo o tempo.
Resumindo, não é porque está de dia que a igreja poderá fazer mais barulho.
As Igrejas possuem alguma permissão especial? Podem elas desrespeitarem as leis?
Não existe na lei federal ou nas leis municipais que conheço qualquer permissão especial, que deixe as igrejas fazerem mais barulho que os demais estabelecimentos. Comento que sobre as leis municipais que conheço, pois imagino (não tenho profundos conhecimentos de todas as leis) que as leis municipais não possam ser contrárias a lei federal, que dá prioridade ao sossego.
O que vemos são igrejas desrespeitando a lei em nome de Deus, o mesmo Deus que diz em sua palavra que devemos respeitar estas leis. Volumes excessivos durante o dia, vigílias na madrugada em regiões residenciais, igrejas construídas em zonas que não permitem estabelecimentos com barulho excessivo.
Não é incomum vermos a justificativa que os bares, as baladas e festas não cristãs fazem barulho e por isso se sentem no direito de cometer a mesma infração. Outros líderes dizem que Deus dará o livramento, que é para a obra dele, e por isso você pode infringir a lei.
Enfim, as justificativas são as mais diversas, mas em todos os casos normalmente estes líderes estão errados, estão pecando e levando toda a igreja a pecar, causando danos à imagem da igreja na comunidade.
E a questão da saúde?
Ruídos em excesso além de causar danos ao aparelho auditivo, levando em casos extremos a surdes parcial ou total, podem também traze transtornos psicológicos, afetando o comportamento, chegando a despertar raiva e comportamentos agressivos.
Ao mesmo tempo que o som e a música podem ser ferramentas úteis para a igrejas, servindo para alcançar e abençoar vidas, podem se tornar verdadeiras ferramentas que envergonham a Cristo e a sua Igreja.
Um exemplo típico que causa bastante incomodo dentro das igrejas é o uso inadequado da bateria acústica, que devido suas características, oferece poucos recursos próprios para controle do seu volume, obrigando muitas vezes a toda a banda a aumentar o volume, elevando o volume a níveis acima do aceitável.
Aqui no site temos um artigo que ajuda neste caso: “Como fazer para o baterista diminuir o volume da bateria na igreja”
Não deixe o mundo entrar na igreja
Defendo sempre que a igreja deve ser exemplo e ensinar que seus membros sejam exemplos para a comunidade em que residem, respeitando as leis, não seguindo o exemplo do mundo. Não é porque o bar da esquina faz errado que você pode fazer errado.
Se fala tanto em não deixar que costumes mundanos entrem no ambiente da igreja, fugimos dos ritmos musicais, de roupas, de cores, maquiagens ou gírias, mas quando o assunto é dar um jeitinho, o jeitinho brasileiro, o andar segundo a lei, cumprir com as obrigações legais, pagar os impostos, alvará, licença do bombeiro, controle do nível de ruídos, documentação para obras, vemos líderes esquecendo que o mundo faz assim, do jeito errado, e este comportamento mundano entrou dentro das igreja e ninguém fica envergonhado, nem incomodado com este fato.
O mundo não estrou apenas nas questões exteriores na igreja, mas no caráter dos líderes e de seus membros, que não se sentem incomodados com práticas ilegais.
Concluindo
A igreja não tem um salvo-conduto que a coloca acima da lei, ela deve respeitar o direito de todo cidadão ao sossego, e buscar de todas as formas e com todas suas formas encontrar meios para continuar pregando o evangelho e ao mesmo ser exemplo de conduta perante a sociedade.
Referências:
– DECRETO LEI Nº 3.688/41 – LEI DAS CONTRAVENÇÕES PENAIS
– NBR 10.152/87 ABNT – NÍVEIS DE RUÍDO PARA CONFORTO ACÚSTICO
– RESOLUÇÃO 1/90 – CONAMA
– LEI Nº 11.501/94 – CONTROLE E FISCALIZAÇÃO DE ATIVIDADES
– DECRETO Nº 34.569/94 – PSIU – PROGRAMA SILÊNCIO URBANO
– LEI Nº 11.944/95 – BARES, CASAS NOTURNAS, CANTINAS, ETC..
[…] Vale a pena a leitura: “A Igreja e a lei do silêncio. Lei do som alto vale nas igrejas? Som alto em igreja é crime?” […]